Tuesday, September 05, 2006

Não se pode ter tudo o tempo todo



Sempre achei lindo este negócio de ter grandes amigas! Chorei vendo filmes em que irmãs eram unidas de forma sobrenatural, amigas faziam pactos de sangue na adolescência e mulheres maduras se encontravam numa espécie de confraria de tons rosados.

Infelizmente, passei minha infância e parte da juventude tendo sérios problemas de relacionamento com as colegas de classe. Classe feminina, quero dizer! Nunca me senti adaptada, não era como “elas”. Não gostava de bonecas, nem brincava de casinha; não ligava para batons e nem via graça em casar na igreja de véu, grinalda e festança. Ao contrário, adorava jogar futebol, era fã dos heróis de capa e espada e sonhava ser uma profissional de destaque, trabalhando em algo grandioso, algo que fosse significativo para mudar a vida das pessoas que, em geral, me parecia muito chata.

Depois que fiquei adulta o problema não foi eliminado, mas pelo menos foi reduzido. Encontrei outras “mulheres esquisitas” que, assim como eu, não repetiam o modelo caricato do feminino. Percebi que havia esperança de encontrar mais mulheres que não se conformavam em reproduzir atos e pensamentos que lhes foram impostos socialmente. Que bom que existiam outras rebeldes!

A alegria nem durou muito tempo, porque percebi que muitas das supostas rebeldes sucumbiam diante do primeiro par de calças e jogavam para o alto todo o sentido de irmandade que as ligavam ao princípio do sagrado feminino. Ou seja, não eram peruas ou barbies, mas pareciam consumidoras enlouquecidas numa queima de estoque quando vislumbravam a possibilidade de conquistar um homem. Esta loucura incluía desde a ofensa a prováveis adversárias quanto o atropelamento sumário de qualquer criatura que ousasse atravessar o seu caminho. Coisa feia de se ver!

O tempo passou mais um pouquinho e percebi que também havia um rancor velado mesmo em algumas que pareciam mais amigas. Um rancor dissimulado em preocupação, puxão de orelha ou no melhor estilo “nem te ligo”. Mas a razão do rancor parecia difusa. Me entristeci várias vezes diante da exclusão de passeios, chopps, conversas, troca de confidências, e quando o assunto vinha à tona a resposta era sempre a mesma “ah... você é casada... ah, você tem namorado...” Por alguma razão o fato de eu sempre ter um homem do meu lado, desde os 14 anos, fez de mim uma excluída dos programas mais divertidos.

A verdade é que nunca me senti parte de uma confraria de mulheres, aliás, com freqüência eu até penso que faço parte, até descobrir que as outras amigas são mais amigas entre si do que minhas amigas. Isto já me gastou muita energia e corroeu a auto-estima. Sempre fico achando que tenho algo de errado, que não sou tão simpática, interessante, brilhante ou “na moda”, como diria minha ex-cunhada. Mas no final das contas, percebo o que sempre enxerguei desde a infância: somente conquistamos a amizade de quem está na mesma freqüência que nós (talvez por isto minhas melhores amigas estão todas descobrindo seus grandes amores). A afetividade tem, necessariamente, a ver com harmonia e identificação. Amar o desconhecido é muito difícil e exige um nível de desprendimento muito grande, é mais fácil amar o parecido ou ao menos o conhecido.

Sempre me senti meio ET, não somente entre as mulheres, mas entre as pessoas. É verdade que sempre fui muito mais aceita e querida no meio masculino, mas isto talvez aconteça porque os homens não cultivam com tanto afinco o hábito de julgar, classificar e separar. Homens são mais simples, básicos: ou gostam ou não gostam, não se preocupam em saber porque.

Não sei o que faz alguém ser amado, querido... não sei o que continua fazendo com que eu me sinta excluída dos grupinhos femininos, mas isto jamais poderá ser um incômodo tão grande que me faça esquecer de coisas tão mais importantes como o fato de eu ter verdadeiras amigas – poucas e boas! Boas não... ótimas! Isto sem falar da bênção com a qual nasci de atrair homens tão incríveis e inteligentes desde nova. Como costumo dizer, todos os meus ex-namorados são ótimos!
Quando vejo tudo isto e acrescento na puxada de conta o meu filho, o Fernando, minha família e meu caminho mágico-espiritual, penso que não se pode ter tudo o tempo todo e fico muito feliz com a parte que me coube. Posso aguardar bem feliz a hora em que encontrarei minhas irmãs/amigas, minha confraria rosa-choque/vermelho-rubi. Sou uma mulher de sorte!

Friday, September 01, 2006

Despertando odaliscas adormecidas

Descobri mais algumas obras muito interessantes. Esta ao lado é um Delacroix, que assim como Matisse produziu uma grande variedade de odaliscas... Picasso também se rendeu aos encantos dessas mulheres que, ao contrário do que se apresenta nas telas, mais velavam do que mostravam o próprio corpo.
O poder de sedução das odaliscas ainda me parece muito presente, mas talvez por razões diferentes. A ousadia que antes marcava estas figuras misteriosas hoje chega a ser ingênua. Uma sensualidade sutil e bela... Uma lembrança amarelada do Sagrado Feminino.
A maior parte dos quadros, que retratam odaliscas, apresenta uma mulher envolta parcialmente em véus ou totalmente nua, deitada ou recostada em uma cama ou divã. Invariavelmente ela está coberta de jóias, pintada, com longos cabelos enfeitados, dormindo ou em pose de quem acabou de despertar. Sem dúvida, diria minha amiga Zoe, são sereias.

Odaliscas: presença marcante no imaginário masculino

Aos 4 anos me fantasiei de odalisca. Minha fantasia preferida, superando até mesmo a fantasia de cigana que vesti aos 5. Mal sabia eu as implicações mais ou menos sutis de uma simples réplica de "Jeanne é um gênio"!
Passeando pela net, descobri a incrível quantidade de odaliscas que levam assinaturas famosas, a marca dos mais brilhantes artistas plásticos de todos os tempos. Temos odaliscas de Matisse (em várias versões), Hayez, Giovanni Zangrando, François Boucher, Francesco Morante... Esta é a minha preferida, de Mariano Fortuny.

Thursday, August 31, 2006

A sabeDORia que o tempo nos traz


Paciência nunca foi, exatamente, um talento que Deus me deu. Talvez, justamente por isto, tenho sido obrigada a desenvolvê-la nos últimos anos. O mais interessante é que não basta ter paciência e nem usar paciência. É importante fazer isto com o mínimo de dor possível. E como é difícil!

Tenho tentado exercitar a generosidade além da paciência. Pode parecer que estou fazendo cursinho para virar santa, mas é muito mais simples que isto: estou tentando ser feliz. Eu disse mais simples... Não disse mais fácil! E tenho percebido que estamos habituados a sofrer desnecessariamente. Sofremos mais pela expectativa da dor do que pela dor em si, não porque vivemos em um mundo de sacrifício, mas porque insistimos em querer ter o controle sobre tudo o tempo todo, o que inclui prever o futuro, com possíveis sofrimentos.

Hoje, Fernando me disse que sou desapegada. Gostaria muito de ser, mas não creio que tenha atingido tal nível de refinamento. Acredito que o que ele chama de desapego seja, na verdade, uma mistura de bom senso, exercício consciente de generosidade e uma boa dose de instinto de auto-preservação. Eu desato os nós antes que as cordas me machuquem. Só isto.

Viver não é um ato involuntário, não é algo que acontece de forma displicente. É preciso aprender a viver. E somente agora tenho a sensação de que estou ensaiando os primeiros passos. Se a vida não começa aos 40, talvez seja só um pouquinho antes!

Olhando para o passado, percebo que sofri tanto por razões tão tolas e tratei com descaso questões realmente importantes. Parece que vamos nos construindo a cada passo de uma forma muito sutil e incompreensível. No entanto, é tudo história pessoal e eu devia me desfazer dela, mas, afinal, o que restaria?

“Nada como um dia depois do outro, com uma noite no meio”, minha avó sempre diz. Me impressiona a sabedoria popular... O desastre de hoje, provavelmente será a tristeza nostálgica de amanhã. O grande amor impossível de um dia, acaba virando uma lembrança doce e distante, lá no fundo da memória. O conflito stressante, razão de riso. A saudade dolorosa, esquecimento anestésico. Tudo é passageiro, menos o motorista, o trocador e o tempo que implacavelmente é testemunha ocular dos ciclos. Perene, inatingível...

Ainda não adquiri o benefício da idade para dar conselhos, mas se pudesse dar algum certamente começaria minha lista por algo como: não sofra excessivamente, portanto não sofra, porque todo sofrimento é excessivo. Depois viria: perdoe sempre, se não puder perdoar, ao menos não fique memorizando a dor que alguém te causou. A dor fica com quem pensa nela e não necessariamente com que a sofre. O terceiro conselho certamente seria: permita-se sentir, permita-se acreditar, permita-se amar. Sem julgamento, sem crítica, sem sentimento de culpa. Passamos metade da nossa vida amando a queima roupa todas as criaturas que fazem os nossos sinos mentais tocarem. E a outra metade nos odiando porque somos assim: tão absolutamente idiotas. Meu terceiro conselho pretende evitar isto.

Depois viriam mil detalhes, porque pratico o pecado da minúcia... Não sentir pena de si; não amar mais os conceitos do que as pessoas; saber a hora de parar e a hora de começar; compreender que o coração sempre será mais sábio do que a razão, mesmo que na hora não faça sentido; não brigar com pessoas, somente discutir idéias; agradecer todos os dias, mesmo que não se saiba porque; praticar o riso sempre que puder, já que o choro costuma chegar de surpresa, etc...etc...etc...

A vida pode ser algo surpreendente desde que cada um se dê esta chance. Desde que não sejamos tão arrogantes a ponto de pensar que tudo está sob nosso controle. Nos últimos anos, o único momento em que “perdi o controle da situação” foi o exato instante em que dei o primeiro passo para ser feliz. É muito bom saber que podemos estar completamente errados, isto abre novas e incríveis possibilidades. E só a sabedoria que o tempo nos traz possibilita esta alegria de errar.

Friday, August 25, 2006

Ética: a prática ridícula

Hoje, por razões nada agradáveis, precisei dar uma lida no Código de Ética dos Jornalistas e na Lei de Imprensa. Meu primeiro pensamento foi uma mistura de indignação e sarcasmo: eis aí dois documentos bem fantasiosos! Sei que cada profissão tem seu karma, mas só posso falar do jornalismo, pois trabalho nisso há quase 20 anos!
Não sei o que mais me impressiona: se a manipulação descarada dos empresários, donos dos grandes veículos de comunicação, ou a cara-de-pau de alguns coleguinhas, que juram de pé junto que ser um bom profissional inclui fazer grosserias, ser arrogante e mal-educado, ou pior, mau caráter. Isto, claro, quando analisamos a realidade das grandes cidades. No interior a banda toca diferente, mas igualmente desafinada.
Por estas paragens são-lourencianas, fico sempre indecisa quando tento analisar o que chamamos de imprensa. Muita gente bem intencionada, mas já sabemos que o inferno já está com sua lotação esgotada, e outros tantos completamente mal intencionados, alguns assumidos, outros dissimulados. Esta é a análise dos empresários, quando chegamos nos funcionários...bem... que funcionários???? De um modo geral, os veículos de comunicação aqui funcionam em esquema de empresa familiar, sem contratados, sem profissionais, óbvio, sem jornalistas (nem com experiência, muito menos com diploma). Dedução? Estes veículos também trabalham SEM NOTÍCIA.
Quem mora numa metrópole e lê estas minhas palavras tão irritadiças, quase rudes, pode pensar que se trata de puro exagero leonino, coisa de mulher “naqueles dias”. Eu gostaria que fosse, mas infelizmente não é. Os veículos de comunicação não comunicam... quando comunicam, trata-se de uma comunicação precária. Os releases que foram criados, se não me falha a memória, para fazer uma divulgação geral para a imprensa, dando apenas a base inicial de informações para que o repórter corra atrás e faça sua pesquisa, entrevistas ou cobertura do evento, por aqui vira matéria, no melhor estilo bate-pronto. O engraçado é que ninguém fica constrangido com o fato das matérias saírem todas iguaizinhas em todo lugar. Talvez porque ninguém leia, nem mesmo os donos dos jornais.
E aí, para piorar a situação, quando alguém fala de ética costuma confundi-la com corporativismo, uma das práticas mais degradantes que se vê por aí: verdadeira formação de quadrilha, com voto de silêncio, pacto de incompetência e união de irresponsabilidades, além de interesses em comum.
Que mundo torto este! Tudo bem que já desisti de ser a guardiã cósmica da ética, só lamento que eu tenha perdido a inocência em relação a isto tanto tempo depois das bombásticas revelações sobre a não existência de Papai Noel e Coelhinho da Páscoa, duas tão relevantes figuras do imaginário infantil. Se eu tivesse sido tão esperta na primeira situação quanto fui na segunda, talvez não tivesse sofrido tanto, por tanto tempo. Na verdade, cá pra nós e bem ao pé do ouvido, no fundo ainda sou uma tola que acredita que as pessoas “têm jeito” e que, no fundo, ninguém é tão mau assim e todos possuem um bom coração. Pena que tanta gente não faça a menor questão de me confirmar esta teoria.
Tenho, nos últimos dias, me lembrado muito do meu avô, que, nascido no começo do século passado, acreditava piamente que a palavra de um homem tinha valor. Hoje, vivemos em uma época que nem documentos por escrito, registrados em cartório e com firma reconhecida, querem dizer muita coisa. Ninguém liga pra sua honra, dignidade ou brio. O dito em um dia é desdito no outro, sem que nada pareça estranho ou incorreto. E as pessoas parecem estar enlouquecendo diante do seu tédio rotineiro, seu vazio interior, sua falta de ideais mais elevados ou mesmo de um amor que lhe aqueça a cama. Tenho me espantado bastante com a quantidade de gente louca com a qual sou obrigada a conviver.
Qual a solução pra esta balbúrdia toda? Não faço a menor idéia! Mas, com certeza, um bom começo seria se as pessoas parassem de se ocupar da vida alheia para fugir da sua própria infelicidade. Minha proposta seria que cada homem ou mulher procurasse olhar para suas próprias limitações, tristezas e carências e tentasse resolver isto. Depois, quem sabe? Uma mudada no lay-out? Um regime, um tratamento psiquiátrico, acompanhamento de eletrocardiograma e taxa de glicose, porque quando o coração reclama e o corpo precisa quebrar a amargura com açúcar, tem algo de errado acontecendo. E não é com os outros.
Enfim... Fico eu aqui palpitando, querendo dar jeito no mundo, quando não consigo dar jeito nem na sala onde eu trabalho! Mas é que me parece muito estranho que o ridículo seja agir da forma correta, honesta e justa. E o bacana tenha se tornado a atitude cínica, sarcástica ou sacana. Ah, se meu avô ainda estivesse vivo... o pobrezinho, aí sim, morreria de desgosto... por ver o quanto vale, nos dias de hoje, a palavra de um homem.

Wednesday, August 23, 2006

Tem que começar de algum jeito, né?

Pior coisa que tem é escrever sem vontade. Teve uma época da minha vida em que eu acreditava que jamais seria capaz de não ter vontade de escrever. Mais velha, com mil preocupações na cabeça, percebi que era possível sim... que às vezes perdíamos o viés do assunto e as palavras brincavam de pique-esconde. E como são boas em se esconder as danadas! Outras vezes, por ser obrigada a exercer outra profissão, que não a minha de diploma e coração, também fiquei avessa aos textos longos e bem articulados. Era uma dificuldade escrever um ofício de cinco linhas! Parecia sem fim aquele "venho através deste solicitar..." Que coisa tão formalmente sem sentido! Mas agora, que resolvi fazer as pazes com as palavras e dar mais valor ao que realmente importa, decidi criar este espaço. O objetivo? Nem sei ao certo! Mas acho que começa com o puro e simples exercício da disciplina... Um dia de cada vez... Um dia depois do outro... Um tempo para cada coisa... Cada coisa em seu lugar.