Saturday, May 16, 2009

Cega, Surda e Muda


Tenho me sentido como Tommy - aquele da Ópera Rock - cega, surda e muda. Um ser totalmente desconectado de tudo mais. O hilário dessa história é pensar que sou formada em Comunicação e trabalhei com isso, com direito a prêmio e elogios variados, durante 20 anos.

O sonho em que grito sem que haja voz, sem que haja som, palavras, retornou. Não sonhava com isso há muitos anos. Mas agora é como se eu não conseguisse me expressar nem no mundo dos sonhos. Ou então consigo... grito tanto, mas tanto, que acordo rouca e com dor de garganta. É incrível que, do jeito que falo tanto, ainda haja tanto mais a ser dito e que não consigo expressar. Há mais de um mês minha voz não sai direito, passo meus dias tossindo, pigarreando, com dor de garganta. É como se algo estivesse entalado, preso no meio do caminho: nem sai e nem entra. Sufocado durante tanto tempo que nem sei mais do que se trata...

Quando não sei o que dizer, mas sinto uma necessidade torturante de me expressar, choro. E quando o marido me pergunta o que aconteceu, não sei dizer. É como se eu quisesse declarar algo... algo que me tortura, algo que me desespera, algo com o qual não sei lidar e no entanto não sei o que, não sei como, não sei porquê. Só que tem horas que tudo parece explodir tão forte dentro de mim que fica o medo de que as fundações dos meus pés e as paredes de carne de meus órgãos não sejam firmes o suficiente para suportar tamanha pressão. Tenho medo de me ver em mil pedaços: corpo, mente, sentimentos, memória e o vazio que está guardado por tanto tempo que nem sei mais viver sem ele.

Sonho com câmaras de descompressão de profundidade hermética, para poder deixar transbordar em ondas as paredes que me apertam as entranhas. Para poder vomitar as palavras e imagens das quais me alimentei durante 40 anos e que nunca me fizeram bem ao estômago, ao pulmão, ao sangue, ao timo. Sonho com a hemodiálise onírica capaz de retirar todas as águas escuras de meu corpo imaginário, retirar todas as águas que transbordam e vazam em cada casa onde moro, em cada palavra que calo e saltam, suicidas, pelas pupilas. Eu odeio toda essa água que me perturba o sono. Eu odeio toda essa água Rainha de Copas que me faz invejar o que não tenho ou que não consigo ver - apesar de estar lá.

De alguma forma eu queria poder colocar pra fora tudo... como um bazar de garagem... as tranqueiras do meu ser. E me pergunto se há alguém louco o suficiente para querer carregá-las! Não consigo expulsar os intrusos de meu corpo-lar, que já habitam o mesmo lugar há tanto tempo que ganharam o uso capião da minha alma. Gente estranha! Odeio gente estranha! E tem montes delas dentro de mim!

Queria rasgar meu diploma, mas ainda é algo de que posso me orgulhar e decorar as paredes... apesar dele estar jogado dentro de uma pasta, no fundo de uma gaveta... Aprendi a usar as palavras tão bem que já nem preciso mais viver, sentir ou pensar de verdade, basta organizá-las harmoniosamente... inteligentemente... e pronto! Dá impressão que sou mesmo assim, tão esperta quanto demonstro ser. Não acreditem, por favor... Não sou publicitária, sou jornalista e meu compromisso é com a verdade...rs

Já larguei a imprensa e as assessorias... Agora falta largar o teclado e a papelada. E calar a boca. E fechar os olhos. E trancar a mente. Falta abandonar as últimas palavras, escritas ou faladas. Aprender Libras, sentir os símbolos e só cantar... Assim seria uma boa forma de superar minha gagueira mental, que só repete as mesmas palvras e não conclui as idéias. E pintar um quadro, um grande quadro! Com aquarela... para tirar toda a água que mora dentro de mim, misturá-la com as cores certas e expressar, libertar, o que está preso na torre do meu cérebro.

Sem águas chacoalhando dentro de mim, com o cérebro vazio e sem precisar falar uma só palavra, para explicar o inexplicável, talvez eu seja feliz.


PS: Para quem não entende Libras, lá em cima está escrito: "Eu te amo". Agora só falta o Sinto Muito e o Obrigada.

2 comments:

Flora Maria said...

PÔXA...

Nancy Passos said...

Oi querida, qualquer coisa estamos aqui...rs...

Quando li este texto, ainda não havia comentário e minha reação foi a mesma de sua mãe, PÔXA ....na verdade não há palavras para a sensação que suas palavras provocam, mas dá para 'entender' e solidarizar com oque acontece.

Beijo,
Nancy